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Viagem de moto: O fantástico Centro Geodésico da América do Sul – Parte 2

11 Minutos de leitura

  • Publicado: 07/08/2022
  • Por: Redação

Na mesma expedição ao centro geodésico da América do Sul, em Cuiabá (MT), Ozzy pilotou a BMW 850 GS Adventure, encarou desafios, adversidades e contou a história de sua superação pessoal

Texto e fotos: Oswaldo Fernandes Jr. (Ozzy)

Na edição 294, publicamos a primeira parte desta aventura incrível vivida por Ozzy, nosso colunista. Confira a continuação da saga feita pelo centro geodésico da América do Sul a bordo de uma BMW 850 GS Adventure. Viagem de moto é isso!

Após a visita ao Centro Geodésico e a Chapada dos Guimarães (MT), o roteiro de visitas pelo continuou surpreendendo pela sua história, e a Chapada dos Guimaraes torna-se inesquecível pelas paisagens maravilhosas, belíssimas cachoeiras e de pessoas acolhedoras, que recebem e proporcionam toda a empatia do povo mato-grossense.  Maravilhoso. Sem dúvida enriqueceu e deixou o gostinho de quero mais, e eu queria mais!

Continuando a expedição rumo a Bolívia

No intuito e vontade de querer explorar novos lugares, outras oportunidades e mais aventuras, decidi por tomar rumo a cidade de Cáceres e, posteriormente, a fronteira com a Bolívia, na passagem fronteiriça por La Curicha e seguindo a San Matias, na Bolívia. 

Um roteiro de aproximadamente 500 km, onde as estradas do território brasileiro são de perfeita conservação, em paisagens monótonas de vegetação baixa, áreas de plantação de grãos, mas com um calor infernal. 

Com tanque cheio parti logo cedo para aproveitar o frescor matutino da região de 33 graus. Estradas monótonas, onde não há variedade nem muita qualidade em postos de abastecimento, sendo necessário carregar água e por vezes alguns alimentos.  E assim segui meu caminho, e por vezes reclamava comigo mesmo da opção feita.

Viagem de moto: Chegada a La Curicha, San Matias e San Martin – Bolívia

Após a cidade de Cáceres a estrada segue entediante e quente.  Praticamente não existe nenhum povoado rumo a fronteira, com longos trechos de retas, e a uns 20 km da fronteira fui convidado a uma parada estratégica em um posto da Polícia Federal.

Tudo verificado e liberado, gentilmente os oficiais me ofereceram água geada e fizeram orientações sobre cuidados e requisitos para a passagem até a Bolívia.  Deste momento em diante não houve mais nenhuma abordagem ou fiscalização de guarda brasileira, impressionantemente a estrada acaba, sigo por um trecho de terra de uns 5 km, encontro um pequeno marco com cores brasileiras, uma minúscula ponte sobre um rio de águas cristalinas, outro marco com cores bolivianas, e pronto, entrei na Bolívia. 

Logo à frente, uns 3 Km, existe um posto alfandegário boliviano, onde tudo verificado, sigo a cidade San Matias e depois até San Martin. Pela estrada sigo por mais 180 km, apreciando rios de águas cristalinas, paisagem que por vezes me lembravam florestas e um povo de expressão sofrida, humilde.

Por algumas vezes senti medo, com receio e desconfiança de assaltos.  Consegui um quarto simples em um hotel de duas estrelas, que me fizeram reviver momentos de viagens pelas cordilheiras no Peru. 

Uma noite mal dormida pelas imagens e preocupações do dia anterior, resolvo partir deste ponto e retornar ao Brasil. Foram momentos de muita apreensão, nenhuma parada, até passar a bendita ponte dos marcos dos países. Momento de alívio ao entrar novamente em meu país.  Ali, a intuição falou mais forte que o desejo de aventura!

De volta ao BrasilViagem de moto inesquecível

Continuando a viagem de moto, a entrada ao Brasil foi sem nenhuma intervenção, e fiz questão de parar no mesmo posto da Polícia Federal, aproveitando a água gelada e rever os amigos.  Meu novo destino seria a cidade de Tangará da Serra (MT). Uma parada técnica para abastecimento e alimentação foi feita em um posto de gasolina, que havia sido inaugurado recentemente na cidade de Barreirinho (MT), distante 280 KM da cidade que seria meu ponto de parada daquele dia, em Tangará da Serra.  

Alimentado com um lanche do tipo Bauru, uma coxinha e um refrigerante e com a moto abastecida, passei a guardar a garrafa de água e um pacote de biscoito, adquiridos para o kit de sobrevivência, já que o anterior havia sido consumido na Bolívia. Eram 16 horas da tarde, enquanto ajeitava as provisões e validava malas e as condições da motocicleta, não podia imaginar que a aventura iria começar, se não uma das maiores, seria uma das mais insanas que já vivi.

Aventura e resiliência à prova de tudo

Estava eu no meu processo de partida da viagem de moto, quando um senhor de traços nativos regionais e de fala mansa, com sotaque por vezes em português, outras espanhol, algumas indígenas e de tantas que por vezes não entendia bem o que ele falava, gerou uma conversa animada sobre moto, viagens, lugares, paisagens e a vida. 

Boa prosa e de muita admiração dele pela motocicleta, e me perguntou para onde eu iria. De bate pronto disse que seguiria a cidade de Tangará da Serra, e informei o caminho que iria passar.  O “meu amigo” prontamente admirado, se impôs ao meu roteiro, e em tom de voz alto, naquele padrão que por vezes não entendia muito bem, começou a me explicar um melhor caminho, onde se eu fosse para a cidade de Lambari D’Oeste, a 130 km de onde eu estava, por uma outra via da que havia me programado para chegar a Tangará da Serra, e depois seguisse por uma estrada de terra, que segundo ele estava em ótimas condições por cerca de 50 Km, chegaria muito mais rápido, que no percurso dele daria 180 Km, e no meu roteiro proposto 280 Km, ou seja, no caminho dele eu estaria reduzindo em 100 Km meu roteiro.

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A diferença seria que neste caminho dele teria 50 Km de terra, no meu entender.    Eram 17 horas da tarde, e eu resolvi seguir pelo caminho orientado do meu mais recente “amigo”.

Boas práticas de segurança para expedições de motocicletas

Desenvolvo atividades relacionadas com treinamento, informação e experiências positivas em motociclismo, além de, é claro, viagem de moto. Nestas ações profissionais sempre aconselho boas práticas, atos seguros e ações racionais ao invés de emocionais.

Faz parte dos principais itens que proponho aos meus treinandos a real necessidade de alterações de percursos validados, digo: “tenham muita atenção sobre alterações de rotas programadas.  Mudanças de rotas por lugares desconhecidos estabelecem aumento direto de perigo, assim como a necessidade de maior atenção, estado de alerta em nível máximo e maior gestão de risco”.  Pois é, e o que fiz?  Mudei a minha rota, segundo informações que não me preocupei a validar.  Puro descaso comigo mesmo.

A mudança de rota e o rumo à superação e à resiliência

Me despedi de meu “amigo” e segui rumo a cidade de Lambari D’Oeste, distante 120 km.  O percurso foi tranquilo, estrada asfaltada, fim de tarde e temperatura agradável. Aliás, uma tarde maravilhosa vivida mais uma vez pelo motociclismo de aventura, e que aventura! Passei a cidade de Lambari D’Oeste, encontrei a estrada de terra, segui firme para o percurso de 50 Km de estrada de terra “boa” até a cidade de Tangará da Serra.  

Dia acabando e a viagem de moto começando

Ao percorrer pela estrada de terra comecei os 20 primeiros Km com muita animação, terra firme, batida, num lindo pôr do sol das 18h30. Ao chegar aos 30 km percorridos, a estrada começou a estreitar e o sol brilhar. Próximo dos 40 km, pontes de madeiras para passar, onde por vezes faltavam tábuas pelo meio da estrutura. 

Passando dos 60 Km começaram subidas e descidas, muito mais árvores em áreas fechadas onde o sol se punha. Aos 70 km percorridos encontrei uma grande área com areia no solo, onde a moto insistia em escorregar. Logo à frente, via uma caminhonete nova, vinda em velocidade reduzida devido às condições da estrada, onde estiquei meus braços, chamando a atenção do condutor para uma parada de informação. 

Surpreendentemente ao parar, o condutor da caminhonete, com feição de assustado pergunta: “quantos km para eu chegar ao asfalto?”. Eu pensando comigo que meu amigo havia informado que seriam 50 km de terra, eu já havia percorrido 70 km, disse com tom irônico ao motorista: “faltam 70 km, ele com expressão desapontada ficou me olhando, e eu perguntei a ele e pra mim?”. Deveria faltar pouco, pois já havia percorrido 70Km dos 50 informado. O motorista com cara de desapontado me fala: “mais 150 Km, você é doido”. Naquele momento parecia que o mundo parou, não sabia se respirava, se orava, ou se começava a xingar meu amigo da informação. 

Depois de alguns momentos, o coração voltou a bater, o pulmão a encher de ar e a coragem a revigorar.  O motorista da caminhonete me aconselhou a voltar, mas eu decidi seguir em frente, e assim foi.  Confesso, foi uma decisão difícil pra caramba.  À noite caiu e a moto quase cai também, por várias vezes.  O cansaço era excessivo, o arrependimento gigante, a concentração dispersa e o acidente na eminência.

Controle emocional e resiliência

Assim foi por dezenas de km, estrada de terra, por vezes com areia, pontes, pedras soltas, curvas, subidas e descidas.  Não foi fácil não! Próximo das 23 horas, nada de estar chegando ao destino, eu em péssimo estado de controle físico e mental, ao ver um barracão de madeira na beira da estrada, tomei a decisão de descansar por ali mesmo. 

Parei a moto rente a parede do barracão, me acomodei como pude, consumi minha água e pacote de biscoito, e tentei dormir o quanto possível. A noite foi longa, em algum extremo do Mato Grosso, ao som de serenatas de uivos, coaxos, grunhidos e sons que não soube interpretar.

Cercado de sapos e alguns camundongos fui acolhido. Às 4h30 da manhã, de uma noite interminável, me levantei para contemplar os primeiros raios de sol da manhã ao som de milhares de cantorias de pássaros enaltecendo a chegada de mais um dia.  Sobrevivi, agradeci, me lavei como pude e tinha o desejo de um beijo, um abraço e uma cueca nova, não necessariamente nesta ordem. 

Cansado ainda, mas feliz pela aventura insana, sigo pilotando pela estrada interminável.  A pista era horrível, por vezes achei bom não ter visto direito pela noite, agradeci o encontro do barracão e a força de minha fé, bem como a proteção divina em poder superar esta grande aventura, sozinho.

Chegando ao hotel em Tapera da Serra

Consegui chegar ao hotel próximo das 11 horas da manhã, cansado, tingido de tijolo andante, com fome e tendo a impressão de que tudo seria um sonho e que em breve seria acordado. De repente o atendente do hotel pergunta qual foi meu caminho, eu expliquei, e ele perguntou: “veio pela estrada de terra”? E ao confirmar, ele admirado falou: “você é louco, aquela estrada é de rota de traficantes”.

Neste momento, meus pensamentos foram tomados por um turbilhão de emoções e questionamentos sobre riscos. Quem seria o meu amigo da estrada? Quais a intenções da indicação daquela estrada? Porque? Como me permiti?

E muitas outras perguntas, enfim, ainda bem que deu tudo certo. Fortaleci conceitos de segurança nas rotas, aumentei minha percepção sobre os riscos, e mais uma vez senti o quanto Deus está próximo e me faz feliz.   

A viagem continuou, passei pelo estado de Goiás, entrei em São Paulo e cheguei em casa, feliz, pensando em tudo que passei, da necessidade de atenção a mudanças, da força em ser resiliente diante dos problemas e a importância de sentir Deus, sempre, mesmo naqueles momentos mais difíceis em que pensamos estar sozinhos.

É isso aí! Viva a vida propondo muito mais sentido, em grandes aventuras e com muitas emoções. Nos vemos pelas estradas, sempre!

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